domingo, 28 de dezembro de 2014

Vinho faz tão bem quanto exercícios físicos

Vinho faz tão bem quanto exercícios físicos

23 de dezembro de 2014
wine
O ano de 2014 está quase no fim. E talvez você ainda não tenha cumprido aquela antiga promessa de fazer mais exercícios físicos. Deixa esse papo para janeiro. Por ora, você pode compensar esse sedentarismo de outro jeito: uma taça de vinho faz tão bem para o corpo quanto uma hora de atividades físicas.
Funcionou com ratos, pelo menos. Ao longo de quatro meses, pesquisadores incorporaram à dieta deles uma substância chamada resveratrol, encontrada em nozes, alguns tipos de frutas e vinho tinto. E os ratinhos se deram bem. Ganharam mais força nos músculos esqueléticos, e apresentaram melhora nas funções cardíacas e no metabolismo. Foi como se eles tivessem feito exercícios físicos arduamente. Enquanto, na verdade, só tiraram proveito da substância encontrada no vinho tinto.
Bem, é essa a dica que a ciência vos deixa.
Crédito da foto: flickr.com/rpeschetz/
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Como cai um avião

Como cai um avião

O avião é o meio de transporte mais seguro que existe. Mas algo sempre pode dar errado. Quais são os principais riscos de voar? E o que realmente pode acontecer durante um acidente?

por Bruno Garattoni e Sylvia Estrella

"Senhores passageiros, sejam bem-vindos. Em nome da SincereAir, a companhia aérea que só fala a verdade, peço sua atenção para algumas instruções de segurança. Primeiramente, gostaríamos de parabenizar os passageiros que estão sentados no fundo da aeronave - em caso de emergência, sua chance de sobreviver será bem maior. Durante a decolagem, o encosto de sua poltrona deverá ser mantido na posição vertical. Isso porque, em nossa nova e moderna frota de aeronaves, as poltronas da classe econômica são tão apertadas que impedem a evacuação da aeronave em caso de emergência. Na verdade, se a segurança fosse nossa maior prioridade, colocaríamos todos os assentos virados para trás. Metade do ar dentro da cabine é reciclado, o que nos ajuda a economizar combustível. Isso poderá reduzir a taxa de oxigênio no seu sangue, mas não costuma ser perigoso - e geralmente causa uma agradável sonolência. Mantenha o cinto de segurança afivelado durante todo o voo - ou você poderá ser vítima de turbulência, que é inofensiva para a aeronave, mas mata 25 passageiros por ano. Lembramos também que o assento de sua poltrona é flutuante. Não que isso tenha muita importância: a probabilidade de sobreviver a um pouso na água com um avião grande é mínima (geralmente a aeronave explode ao bater na água). Obrigada por terem escolhido a SincereAir, e tenham todos uma ótima viagem!"
Leia também: Como escolher seu assento no avião

Nenhuma empresa aérea revelaria verdades como essas. Afinal, mesmo que o avião seja o meio de transporte mais seguro que existe, ele não é (nada é) 100% seguro. A partir de uma série de estudos feitos por especialistas, chegamos às principais causas de acidentes - e descobrimos fatos surpreendentes sobre cada uma delas. Prepare-se para decolar (e cair).


Despressurização Quando as máscaras caem.

Quanto mais alto você está, mais rarefeito é o ar. Com menos resistência do ar, o avião consegue voar muito mais depressa - e gasta bem menos combustível. É por isso que os aviões comerciais voam bem alto, a 11 km de altura. O problema é que, nessa altitude, a pressão atmosférica é muito baixa (veja no infográfico abaixo). Não existe ar suficiente para respirar. Por isso, os aviões têm um sistema que comprime o ar atmosférico e joga dentro da cabine: a pressurização. É uma tecnologia consagrada, que estreou na aviação comercial em 1938 (com o Boeing 307). Mas, como tudo na vida, pode falhar. Sabe quando a aeromoça diz que "em caso de despressurização, máscaras de oxigênio cairão automaticamente"? Não assusta muito, né - parece bem menos grave do que uma pane na turbina do avião, por exemplo. Ledo engano. A despressurização pode matar, e rápido. Ao contrário do afogamento ou de outros tipos de sufocação, aos quais é possível resistir por alguns minutos, uma despressurização aguda faria você apagar em menos de 15 segundos. Em agosto de 2008, um Boeing 737 da companhia Ryanair, que ia para Barcelona, sofreu despressurização parcial da cabine. "Veio uma lufada de vento gelado e ficou incrivelmente frio. Parecia que alguém tinha aberto a porta do avião", contou um dos passageiros ao jornal inglês Daily Telegraph. Para piorar as coisas, nem todas as máscaras de oxigênio caíram automaticamente. E, das que caíram, várias não liberavam oxigênio. O que salvou os 168 passageiros é que o avião estava voando a 6,7 km de altura, mais baixo do que o normal, e isso permitiu que o piloto reduzisse rapidamente a altitude para 2,2 km, onde é possível respirar sem máscara.



Falha estrutural (ou como a força G pode despedaçar a aeronave). O avião pode perder uma asa, leme ou outra parte vital quando está no ar. Quase sempre, o motivo é manutenção malfeita - a estrutura acumula desgaste até quebrar. Mas isso também pode acontecer com aeronaves em perfeito estado. Se o piloto fizer certas manobras, gera forças gravitacionais muito fortes - e a fuselagem arrebenta. Foi o que aconteceu em 2001, com um Airbus A300 da American Airlines que decolou de Nova York. O piloto pegou turbulência, se assustou e tentou estabilizar a aeronave com movimentos normais, porém bruscos. O rabo do avião quebrou e o A300 caiu, matando 260 pessoas. Pode parecer um caso extremo, mas a resistência dos aviões à força G é uma preocupação central da indústria aeronáutica. Os jatos modernos têm sistemas que avisam quando estão voando com ângulo, velocidade ou trajetórias que possam colocar em risco a integridade da fuselagem. E a Boeing adiou o lançamento de seu novo avião, o 787, para alterar o projeto dele (simulações indicaram que, durante o voo, as asas poderiam sofrer forças G altas demais).



Pane nas turbinas Acontece. Mas não pelo que você pensa.

O maior inimigo das turbinas não são as falhas mecânicas; são os pássaros. Entre 1990 e 2007, houve mais de 12 mil colisões entre aves e aviões. As turbinas são projetadas para suportar alguns tipos de pássaro (veja abaixo), e isso é testado em laboratório com uma máquina, o "canhão de galinhas", que dispara frangos mortos contra as turbinas a 400 km/h. Desde 1990, 312 turbinas foram completamente destruídas em voo pelos pássaros. Se o avião perder um dos motores, consegue voar só com o outro. Mas, se isso acontecer durante a decolagem, quando a aeronave está baixa e lenta (90% dessas colisões acontecem a menos de 1 000 metros de altitude), ou se os pássaros destruírem ambas as turbinas, as consequências podem ser dramáticas. Como no incrível caso de um Airbus A320 da US Airways que perdeu os dois motores logo após decolar de Nova York, em janeiro de 2009. Mesmo sem nenhuma propulsão, o piloto conseguiu voar mais 6 minutos e levar o avião até o rio Hudson. Num dos raríssimos casos de pouso bem-sucedido na água, ninguém morreu.



Falha nos computadores Sim, eles também se enganam. E quando isso acontece...

Os computadores de bordo são vitais na segurança de voo. Mas também podem falhar. Como no caso do Airbus A330 - o mais computadorizado dos jatos atuais. Nos últimos 12 meses, sete A330 enfrentaram uma situação crítica: partes do computador de bordo desligaram ou apresentaram comportamento errôneo. Num desses casos, o desfecho foi dramático (o voo da Air France que ia de São Paulo para Paris e caiu no oceano Atlântico, matando 232 pessoas). Mas o problema não é exclusividade da Airbus. Em agosto de 2005, um Boeing 777 da Malaysia Airlines que decolou da Austrália teve de retornar às pressas depois que, aos 18 minutos de voo, o piloto automático começou a inclinar o avião de forma perigosa. Era um problema de software.



Erro humano Na maior parte das vezes, o piloto tem (alguma) culpa.

Os acidentes aéreos são uma sequência de erros que se somam. E, em 60% dos casos, essa equação inclui algum tipo de falha humana. A pior de todos os tempos aconteceu em 27 de março de 1977. Foi na ilha de Tenerife, um enclave espanhol a oeste da costa africana. Vários fatores se juntaram para produzir essa tragédia. Primeiro: um atentado terrorista fechou o principal aeroporto de lá e fez com que todo o tráfego aéreo fosse desviado para um aeroporto menor, Los Rodeos, que ficou sobrecarregado e cheio de aviões parados no pátio. Entre eles, dois Boeing 747. Um vinha de Amsterdã, o outro de Los Angeles. O avião americano solicitou autorização para decolar. Quem estava no comando era o piloto Victor Grubbs, 57 anos e 21 mil horas de voo. A torre de controle respondeu negando - era preciso esperar a saída do outro 747, o holandês, pilotado pelo comandante Jacob van Zanten. Zanten ficou impaciente, porque sua tripulação já estava em serviço havia 9 horas. A torre de controle reposicionou as ae­ronaves. O nevoeiro era muito forte e, por um erro de comunicação, o avião americano foi parar no lugar errado. Ignorando instruções, o 747 holandês começou o procedimento de decolagem. Ace­lerou e bateu com tudo no outro avião, que manobrava à frente. Foi o pior acidente da história, com 583 mortos.




Turbulência Como o avião pode perder a sustentação no ar.

Turbulência não derruba avião. Os jatos modernos são projetados para resistir a ela. Você já ouviu esse discurso? É uma meia-verdade. Um levantamento feito pela Federal Aviation Administration (FAA), agência do governo americano que estuda a segurança no ar, revela que entre 1992 e 2001 houve 115 acidentes fatais em que a turbulência esteve envolvida, deixando 251 mortos. Na maior parte dos casos, eram aviões pequenos, mas também houve mortes em aeronaves comerciais - as vítimas eram passageiros que estavam sem cinto de segurança, e por isso foram arremessados contra o teto a até 100 km/h (velocidade suficiente para causar fratura no pescoço). Ou seja: em caso de turbulência, o maior perigo não é o avião cair. É você se machucar porque está sem cinto. Os aviões têm instrumentos que permitem detectar com antecedência as zonas turbulentas, dando tempo para desviar, mas isso nem sempre é possível: existe um tipo de turbulência, a "de ar limpo", que não é captada pelos instrumentos da aeronave. Felizmente, é rara: só causou 2,88% dos acidentes fatais.


Veja também
Infográfico: O que acontece numa turbulência de avião


Pane hidráulica Existe um encanamento que corre por toda a fuselagem. Se ele furar, as consequências podem ser terríveis.

Os controles do avião dependem do sistema hidráulico - uma rede de canos que liga o cockpit às partes móveis do avião. Esses canos estão cheios de fluido hidráulico, uma espécie de óleo. Quando o piloto dá um comando (virar para a esquerda, por exemplo), um sistema de bombas comprime esse óleo - e o deslocamento do líquido movimenta as chamadas superfícies de controle. São as peças que controlam a trajetória do avião, como o leme e os flaps. O sistema hidráulico é tão importante, mas tão importante, que os aviões modernos têm nada menos do que três: um principal e dois de reserva. Por isso mesmo, a pane total é muito rara. Mas ela é o pior pesadelo dos pilotos. "O treinamento para situações de pane hidráulica é muito frequente e exige bastante dos pilotos", explica o comandante Leopoldo Lázaro. Se os 3 sistemas hidráulicos falharem, a aeronave perde totalmente o controle. E isso já aconteceu. Em julho de 1989, um McDonnell Douglas DC-10 decolou de Denver com destino a Chicago. Tudo corria bem até que a turbina superior, próxima à cauda do avião, explodiu. Estilhaços do motor penetraram na fuselagem e cortaram os canos de todos os sistemas hidráulicos. O avião não tinha como subir, descer, virar nem frear. Aí o comandante Alfred Haynes, 58 anos e 37 mil horas de voo, realizou uma das maiores proezas da história da aviação. Usando o único controle de potência das turbinas, o único que ainda funcionava no avião, conseguiu fazer um pouso de emergência. A aeronave explodiu, mas 185 dos 296 passageiros sobreviveram.


Um avião grande carrega 600 litros de fluido hidráulico, que se distribui por redes de canos.



Fonte - Boeing


Meses de risco Em quais épocas do ano acontecem mais acidentes*

Jan - 8,96%

Fev - 7,4%

Mar - 8,77%

Abr - 6%

Mai - 5,84%

Jun - 8,18%

Jul - 9,74%

Ago - 8,96%

Set - 9,55%

Out - 8,18%

Nov - 9,55%

Dez - 7,79%


* A soma não dá 100% devido a arredondamento.

Fonte - Aircraft Crashes Record Office 


As aeronaves que mais caíram
Em acidentes fatais por milhão de decolagens



Fonte - Boeing 

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

9 suplementos muito usados em academias (e os perigos de cada um)

9 suplementos muito usados em academias (e os perigos de cada um)

2 de dezembro de 2014
Por Raquel Sodré
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Dezembro chegou e quem deixou o Projeto Verão 2015 para a última hora já está correndo contra o tempo. Na busca pelo corpão de praia, entram em jogo também os suplementos alimentares. Mas atenção: os shakes podem ser aliados ou inimigos, dependendo da forma como são consumidos.
“Nem todo mundo precisa de suplementação. Se a pessoa consegue fazer uma alimentação bacana, ela não precisará deles”, explica o nutricionista e educador físico Fernando Antônio Gonçalves Motta. Mas, suponha que a pessoa trabalhe e entra em uma reunião que irá coincidir com o horário de um lanche da tarde, por exemplo. Nesse caso, quando a rotina alimentar for comprometida, usar os suplementos pode ajudar.
No entanto, não basta entrar na primeira loja, comprar um pote de pó para shake e sair tomando. O uso de suplementos só deve ser feito com recomendação de um nutricionista. Fernando dá ficha completa dos suplementos mais utilizados pelos ratos de academia. Veja abaixo seus usos e os problemas que podem trazer se forem mal utilizados.

1. Whey Protein
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O whey é uma proteína isolada de baixa absorção retirada do soro do leite. É o suplemento com maior respaldo científico de eficácia. As mesmas substâncias do whey podem ser encontradas nas carnes, nos ovos e nos derivados do leite. Ele serve para o aumento de massa magra. Mas, em excesso, pode causar uma toxicidade ao organismo, sobrecarregando os rins e o fígado.

2. Maltodextrina/dextrose
É um carboidrato de absorção rápida. “É como se fosse um pão integral, mas o corpo o absorve mais rápido por estar na forma líquida”, compara Fernando. É usado para aumentar a energia para o treino. Porém, se a dosagem não estiver correta, a pessoa pode desenvolver uma intolerância a glicose, além de ter um ganho de peso (pode dar justamente aquela barriguinha que você está tentando aniquilar na academia).

3. Glutamina
A glutamina é um aminoácido essencial muito presente nos músculos e na circulação sanguínea. Ela também tem ação imunológica. Sua função enquanto suplemento alimentar é ajudar na recuperação dos músculos após a atividade física, favorecendo uma reparação mais rápida dos tecidos. Se for tomada sem orientação de um nutricionista, pode causar sobrecarga nos rins, diminuir a produção de urina, causar dores de cabeça e prisão de ventre.

4. Ômega 3
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Muito presente nos peixes como salmão, sardinha e atum, na semente de linhaça, nas castanhas e nos óleos vegetais, o Ômega 3 é um ácido graxo essencial. É antioxidante, modula processos inflamatórios e é um responsável por transportar as vitaminas para os músculos. Em excesso, contudo, pode causar hemorragias e atacar o sistema imunológico.

5. L-Arginina
Trata-se de um aminoácido não essencial encontrado nas canes, no leite, no alho, nos ovos e nos grãos. A L-Arginina aumenta a vasodilatação, aumentando também o volume de nutrientes levados para o músculo que está sendo exercitado. Apesar de não haver comprovação científica, ela poderia estar relacionada ao aumento de massa muscular. O principal problema com ela, no entanto, é que a sobredose poderia causar o efeito oposto, de vasoconstrição – o que pode levar ao aumento da pressão arterial.

6. Creatina
Famosa entre os frequentadores de academias, a creatina é um nutriente sintetizado a partir de três aminoácidos: arginina, glicina e metionina. Sua função é aumentar a massa muscular, pois disponibiliza mais energia (ATP) para o uso no exercício físico. Porém, quando há um aumento muito grande na quantidade de consumo, os rins podem ficar sobrecarregados. Além disso, a pessoa pode começar a ter câimbras com mais frequência.

7. Termogênicos
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No mundo natural, são alimentos que aceleram o metabolismo, como as pimentas, o gengibre e a canela. No Brasil, há termogênicos feitos à base desses ingredientes, e têm sua venda liberada. Já os produtos feitos à base de efedrina – substância com efeitos similares aos das anfetaminas – são proibidos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Dentre os principais problemas causados por eles estão os efeitos sobre o sistema nervoso central, podendo levar à dependência, a taquicardias e a problemas no coração. Mesmo os termogênicos feitos à base de ingredientes naturais não devem ser tomados sem indicação de um nutricionista, já que muitas pessoas são sensíveis a esses alimentos e podem ter reações indesejadas.

8. BCAA
É um composto formado pelos aminoácidos valina, leucina e isoleucina. Sem ele, o corpo não produz uma proteína. Assim, ele seria usado para auxiliar na formação de massa muscular. O problema é que esses suplementos são caros e não têm eficácia comprovada. Além disso, seu consumo poderia ser redundante, pois o BCAA já está presente nas carnes, no leite, nos ovos e até no próprio whey protein.

9. Eletrolíticos
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Os eletrolíticos são sais minerais usados na hidratação. Mas, por serem ricos em sódio, só devem ser usados durante a prática de atividades físicas intensas. Para ser necessário o consumo de eletrolíticos, o treino precisa ter duração superior a uma hora e meia, ou o tempo precisa estar muito quente. Em excesso, o sódio presente nos eletrolíticos pode levar ao aumento da pressão arterial.

terça-feira, 11 de novembro de 2014

É guerra

Em algumas regiões do mundo, tem gente disposta a brigar feio por causa de um balde d’água. Explore o mapa e veja onde o controle dos recursos hídricos gerou conflitos recentemente.

por lucas muniz baptista*
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Para evitar confrontos como esses, a ONU espera que as sociedades desenvolvam mecanismos de ação compartilhada para manejar fontes hídricas capazes de gerar benefícios econômicos e melhorias no padrão de vida das populações envolvidas.

Os mananciais são focos potenciais de disputas, guerras e revoltas, principalmente em regiões áridas de fronteiras.

* Com reportagem de Giovana Moraes Suzin (Dossiê Água, Guia do Estudante Atualidades Vestibular+Enem 2013)

Água: propriedade privada

Em alguns lugares do mundo, água tem dono - e quem quiser usar precisa pagar caro. Saiba por que devemos fazer de tudo para evitar a privatização dos recursos hídricos.

por raquel sodré
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A água está acabando. Mas antes de acabar, ela vai ficar mais rara. E cara. Em algumas regiões do planeta, água já vale ouro - e tem gente ganhando muito dinheiro com isso. Quando a água deixa de ser um recurso natural público, direito de todos, e passa a ser um produto, acontece o que chamamos de “comoditização”.
Existem várias formas de comércio de água. “O que eu temo é que elas fiquem tão comuns que a gente nem perceba quando a água não for mais nossa, nem da comunidade, nem das próximas gerações”, diz Maude Barlow, co-fundadora do Blue Planet Project, organização que trabalha em nível internacional para garantir o direito humano à água. É preciso muita força nos remos para contrariar a maré da privatização.

a fonte do problema

Não é de hoje que a água é tratada como produto. Conheça a história recente do fenômeno
A comoditização da água começou nos anos 1990, quando o Banco Mundial (organização financeira internacional que empresta dinheiro a países em desenvolvimento e economias fragilizadas) promoveu os serviços de água no mercado mundial. Naquela década, com o boom da privatização, o Banco convenceu alguns países que privatizar a distribuição de água para a população era uma boa forma de arrecadar fundos. Nos países que decidiram adotar essa prática, o Estado ainda era o proprietário da água, mas eram empresas privadas que cuidavam de sua distribuição para a população (e eram donas também das instalações necessárias para o serviço). Eram as chamadas “parcerias público-privadas” nos serviços de água.
O problema disso era que, para ter lucro, as empresas que dominavam o serviço subiram os preços da água que chegava às torneiras das pessoas. O povo sentiu no bolso e protestou. A insatisfação fez com que várias cidades comprassem de volta o direito de assumir o controle da água. “Só na França, 40 municípios, incluindo Paris, tornaram a água pública novamente”, diz Barlow.
Além do surgimento das parcerias público-privadas para a gestão da água, os anos 1990 trouxeram a moda da água mineral (nas décadas anteriores, água engarrafada era luxo). Com o passar do tempo, o costume ficou ainda mais popular. “Chegamos ao ponto de ter algo como 260 bilhões de litros de água engarrafada em garrafas de plástico no ano passado. Há países que acham que não precisam oferecer um serviço de água limpa para os cidadãos, porque as pessoas podem simplesmente comprar água engarrafada”, diz Barlow.
Outra forma de privatizar e restringir o acesso à água são os chamados "water tradings" (expressão em inglês para “trocas de água”) que funcionam mais ou menos assim: um país emite licenças para o acesso à água (por mineradoras, por empresas de água mineral, por agronegócios etc). Então, essas licenças são convertidas em direito à propriedade. Assim, as empresas passam a poder comprar e vender esse direito à água no livre mercado - como se fosse soja ou petróleo. O Chile e alguns estados dos EUA são exemplos de lugares que fizeram isso.
A Austrália também fez water tradings, e lá o sistema foi um completo desastre. Mas, quando ele surgiu, em 1994, parecia promissor. O país passava por períodos de seca na época, e o governo pensou que os water tradings serviriam como incentivo para que empresas e agronegócios economizassem água, pois, dessa maneira, a água que sobrasse podia ser vendida. Mas o que aconteceu de verdade foi que as grandes empresas engoliram as pequenas e os grandes agronegócios arrasaram os pequenos produtores. Entraram em jogo também os grandes investidores, e depois os investidores internacionais.
“O preço da água subiu dramaticamente em dez anos, ao ponto de surgirem as figuras de cowboys corretores de água, que fizeram rios de dinheiro”, conta Barlow. Foi mais ou menos como a bolha imobiliária que, segundo especialistas, vivemos agora. Só que, em vez de a especulação ser em cima de imóveis, era em cima de fontes de água. O resultado foi que, quando o governo federal quis comprar de volta os direitos sobre a água do país para salvar da seca a bacia Murray-Darling, não conseguiu pagar o preço que as empresas cobravam.
A água também pode ser comprada por meio dos “land and water grabs” (ou “‘abocanhados’ de terra e água”). Nos acordos desse tipo, uma empresa ou um governo rico compra grandes quantidades de terra em um país mais pobre e reivindica o direito à posse da água dentro daquele terreno. Segundo Maude, na África, há um território equivalente a três Grã Bretanhas que foi comprado por países ricos, investidores internacionais, fundos de cobertura, planos públicos de aposentadoria, dentre outros. “É uma nova forma de colonialismo”, comenta.
Normalmente, a água comprada em um país permanece dentro daquele país, mas legalmente pertence a um agente de fora. Atualmente, alguns poucos países do Oriente Médio compram água do exterior, mas a questão, segundo Maude, é muito controversa. No Canadá, em 1998, o governo de Ontario deu uma permissão para que uma empresa privada vendesse água do Lago Superior para abastecimento e enviasse para a Ásia para engarrafamento. O governo dos Estados Unidos interveio e Ontario cancelou a licença. Atualmente, somente em situações de emergência - como as frequentes secas sofridas pelo sudeste dos EUA - a água é transportada em caminhões pipa para o país vizinho.

Água virtual

Você consome muito mais água do que imagina
Na hora de calcular a água que vai de um país para o outro, também é importante por na conta a “água virtual”. Trata-se de todos os recursos hídricos gastos para a produção de uma coisa. “Se você come um bife no almoço, estará consumindo uma quantidade inacreditável de água [veja mais no nosso quiz], que foi necessária para criar o gado e preparar a carne. O Brasil é um grande exportador de água virtual em biocombustíveis, carne e arroz”, diz Maude Barlow.
Saber mais sobre a água virtual comercializada em cada produto não é desperdício. A conscientização serve para deixar mais clara a situação do comércio internacional de água. No passado, a pressão popular foi imprescindível para desacelerar a privatização e pode voltar a ser um grande trunfo na luta pelo direito à água. Para Maude Barlow, os cidadãos precisam fazer sua parte para garantir que, no futuro, a água não esteja completamente nas mãos de empresas. “Se essa tendência não parar, veremos mais e mais gente morrer por falta de água. Agora mesmo, mais crianças morrem de doenças trazidas pela água do que de qualquer forma de violência, até guerras”, diz a autora.
O problema também é dos brasileiros. Apesar de termos uma das maiores bacias hidrográficas do mundo, o Brasil também sofrerá as consequências de nosso uso desenfreado de água se não tomarmos cuidado. “Digo sempre que vocês precisam olhar para essas políticas [de acesso à água], porque vocês têm secas terríveis em seu país. Vocês estão secando a água de superfície rápido demais. O Brasil, como o Canadá, tem o mito da abundância e pensa que sua água nunca irá acabar. Mas isso não é verdade, e secas como as que estamos vendo em São Paulo, por exemplo, mostram isso”, conclui Maude.

gráfico água virtual

Veja quantos litros de água são usados para se obterem diferentes produtos:
gráfico água virtual
*Uma pessoa bebe de 2 a 4 litros de água por dia
Fonte: ONU

Azul da cor do mar

Saiba o que uma cidade precisa ter para se tornar uma “Blue City” e virar referência mundial em bom uso dos recursos hídricos

Transformar a água do mundo em uma “commodity” é uma tendência que vem desde os anos 1990. Mas não é todo mundo que se conforma com isso, e algumas pessoas não estão dispostas a deixar barato - ou caro, considerando os preços que a água alcança no mercado internacional. Para lutar contra a privatização de um dos nossos maiores recursos naturais da Terra, surgiram as Blue Cities.
Distribuir o título de “cidade azul” é uma iniciativa da organização Blue Planet Project, fundada pela canadense Maude Barlow, que luta por uma nova ética hídrica mundial. Para “colorir-se”, a cidade deve se comprometer a reconhecer a água como um direito humano, um bem e um serviço público - o que significa não privatizar nem seus serviços de distribuição. O lugar também precisa priorizar uma boa qualidade de água encanada, em vez de incentivar o consumo de água engarrafada.
Depois de assumir o compromisso internacional de ser azul, a cidade deve traçar um plano. “Quem ainda não tem água tratada e saneamento básico? Como podemos substituir a água engarrafada nos prédios e eventos públicos? Se não há violações ao direito humano à água naquela comunidade, a cidade deve encontrar formas de ajudar comunidades sem água em outros países”, sugere Barlow.
O projeto já começou a render frutos. ”Nós conseguimos parar a privatização da água em algumas cidades e ganhamos a luta contra empresas de água engarrafada”, conta a ativista. Mas, para ela, o maior benefício das Cidades Azuis é a conscientização que o processo leva aos habitantes da cidade, além da consciência de que a água é um bem precioso e que está em nossas mãos protegê-la.
O projeto começou no Canadá, que atualmente já tem 17 cidades azuis. Berna, na Suíça, foi a primeira fora do país e Cambuquira - uma das estâncias minerais do Sul de Minas - tornou-se a primeira Blue City da América Latina no dia 7 de junho. “Cambuquira é uma cidade de valor excepcional, mas que infelizmente caiu no descaso público. Com a exploração predatória (das águas minerais da cidade), temos diminuído o volume de água possível de voltar à atmosfera na forma de precipitações. Além disso, o engarrafamento tem gerado situações em que as nossas fontes ficam sem maiores cuidados, estando sujeitas a danos irreparáveis. Aliando a luta cambuquirense a uma luta internacional, ganhamos um respaldo ainda maior, e acreditamos que esse é o caminho”, declara Ana Paula Lemes de Souza, presidente da ONG Nova Cambuquira.

Berna

Cambuquira

“O título muda o olhar das pessoas e mostra que a cidade está tendo um comportamento de proteger as nossas águas. A maior vantagem disso, além de dar visibilidade para o município, da proteção e do cuidado com a água, é estimular o cidadão a perceber o valor dessa água”, declara Evanderson Xavier, prefeito de Cambuquira. Em um primeiro passo como Cidade Azul, a prefeitura está agora trabalhando em um projeto de saneamento básico para a cidade - depois de ter inaugurado, em março deste ano, um sistema público de tratamento e distribuição de água que já atende 80% da população.

sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Por que o gato preto é considerado mau agouro?

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A superstição teve origem na Idade Média, quando se acreditava que os felinos, devido a seus hábitos noturnos, tinham parte com o demônio - e se o bichano era da cor negra, habitualmente associada às trevas, pior ainda para ele. Assim, no imaginário medieval, o gato preto tornou-se tão inseparável da mítica figura da feiticeira quanto a vassoura voadora. No século XV, o papa Inocêncio VIII (1432-1492) chegou a incluir o pobre animal em sua lista de perseguidos pela Inquisição, campanha assassina da Igreja católica contra supostas heresias e bruxarias. A perseguição atingiu seu auge na Inglaterra do século XVI, época de repentino aumento da população felina nas cidades. Consta que, em certa noite de 1560, em Lincolnshire, um gato preto foi ferido a pedradas. Encurralado, ele refugiou-se na casa de uma velhinha que costumava dar abrigo a gatos de rua. No dia seguinte, essa pessoa também apareceu machucada - o que fez o povo local concluir que ela era uma bruxa e o gato, seu disfarce noturno.
Nessa tentativa de combater o paganismo, a Inquisição inverteu uma tradição milenar, pois os gatos eram reverenciados como divindades, principalmente entre os antigos egípcios. Na França, a perseguição aos gatos durou até 1630, quando foi proibida pelo rei Luís XIII (1601-1643). Há, no entanto, uma pesquisa do Hospital de Long Island, nos Estados Unidos, que indica que, pelo menos para pessoas alérgicas, o contato com um gato preto pode ter péssimos efeitos. Isso porque os pêlos felinos dessa cor conteriam uma maior quantidade de substâncias alergênicas.

O que são os Zumbis?

Todo mundo já ouviu falar em vodu, palavra que se tornou sinônimo de magia negra e bruxaria da pesada praticamente no mundo todo. Trata-se, na verdade, de um culto religioso praticado nas ilhas caribenhas chamadas Antilhas, principalmente o Haiti, baseado em rituais de possessão e com origem africana - obviamente, parente do candomblé brasileiro e da santería cubana. Para os adeptos do vodu, o zumbi seria como um morto-vivo, fabricado por feiticeiros ressuscitando um cadáver, para transformá-lo em um trabalhador braçal sem vontade própria - mais que um escravo, um autômato de carne. As figuras de zumbis tornaram-se parte do imaginário popular ao inspirarem dezenas de filmes de terror, como o clássico White Zombie, de 1932. Porém, o assunto foi estudado a sério por pelo menos um cientista, o antropólogo e etnobotânico canadense Wade Davis. No início da década de 80, ele passou uma temporada no Haiti, descrita em dois livros:
A Serpente e o Arco-Íris (1986), adaptado para o cinema por Wes Craven (famoso pela série A Hora do Pesadelo), e Passage of Darkness (1988, inédito no Brasil). Davis investigava a hipótese de os zumbis serem pessoas colocadas em estado de transe e catalepsia por meio de um veneno. Sua conclusão foi de que os sacerdotes usavam um pó à base de uma neurotoxina (substância danosa ao sistema nervoso) encontrada em peixes como o baiacu. A narrativa teve impacto imediato na comunidade científica, mas logo foi rejeitada pela maioria - especialmente por um químico japonês especialista em tetrodotoxina, a tal substância. Outros testes foram realizados na amostra do pó comprado de um sacerdote vodu pelo estudioso canadense, mas não se chegou a nenhum resultado definitivo.
A palavra "zumbi" é igualmente cercada de mistério, mas sua origem pode estar nos termos nzambi ou nzumbi, que, em alguns idiomas do oeste africano, significam "divindade" ou "espírito ancestral" - possivelmente a mesma raiz do nome do nosso Zumbi, líder dos escravos rebeldes do célebre Quilombo de Palmares, no Brasil Colonial do século XVII.

Os 15 exércitos mais poderosos do mundo

Guilherme Dearo, de EXAME.com

Os mais poderosos

São Paulo - Qual é o exército mais poderoso e bem preparado do mundo?
É isso o que tenta responder o Global Firepower Index, uma database  - atualizada continuamente - que reúne dados de 106 países.
Levando em conta 50 critérios, a pesquisa mais recente do site montou um ranking dos exércitos mais fortes.
Entre os critérios: orçamento, contingente e tamanho do arsenal.
Veja a seguir os 15 mais poderosos do mundo:
Tópicos: Aeronáutica, Ásia, China, Estados Unidos, Países ricos, Exército, Guerras, Marinha, Rankings, Listas, Europa, Rússia

Os 41 locais mais perigosos do planeta

Honduras

Violência

Atualmente, dezenas de países enfrentam situações de instabilidade. De olho nestas crises, o braço consular do Departamento de Estado dos EUA (U.S. Passports & International Travel) mantém em seu site uma lista atualizada na qual mostra quais locais do mundo apresentam os maiores perigos para suas populações e visitantes.
A relação é baseada em avisos e alertas de viagem emitidos pelo departamento sempre que uma ameaça - como a iminência de uma guerra civil, ondas de violência urbana ou frequentes ataques terroristas - é detectada naquele momento em determinado país. As informações são dedicadas aos cidadãos americanos, mas podem ser aproveitadas por diferentes viajantes, turistas ou não.
A lista atual conta com 41 lugares que foram incluídos primeira vez recentemente ou tiveram avisos anteriores atualizados nos últimos meses. A Ucrânia, que vive momentos de tensão com seus vizinhos russos, e o México, onde o governo há décadas luta contra o narcotráfico, são dois exemplos. Há ainda alertas para a região do Golfo do México e o Mar do Caribe por conta do início da temporada de furacões.
Tópicos: América Central, América Latina, Terrorismo, Ataques terroristas, Crise política, Ebola, Epidemias, Furacões, Oriente Médio, Pobreza, África, Ásia

O que muda se a reforma política ocorrer por referendo ou plebiscito?

  • 30 outubro 2014
Dilma quer consulta popular sobre reforma política, mas Câmara e Senado ainda divergem sobre tema
Para que a presidente reeleita, Dilma Rousseff, tenha êxito em sua principal proposta para seu segundo mandato, a aprovação de uma reforma política, ela terá de se entender com o Congresso quanto à melhor forma de consultar a sociedade no processo.
A proposta original de Dilma é pela convocação de um plebiscito para tratar do tema. Já os dirigentes da Câmara e do Senado preferem que os eleitores participem da reforma por meio de um referendo. A posição do Congresso nesse tema é crucial, já que cabe ao órgão decidir qual modelo será adotado.
Os pontos de vista distintos já provocam atritos entre as autoridades. Na terça-feira, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), disse que "o Congresso pagará caro pela omissão" se autorizar a convocação de um plebiscito, delegando aos eleitores o poder de definir os rumos da reforma.
O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), reforçou a posição de Renan e culpou o PT pela não aprovação de uma proposta de reforma no ano passado.
Também na terça, Dilma flexibilizou sua posição ao dizer em entrevista que "não interessa muito se é referendo ou plebiscito".
A BBC Brasil formulou perguntas sobre o que muda caso cada processo seja adotado.
Leia mais: Novos hábitos criam #eleiçãodaseleições 'permanente' e de repercussão inédita

Qual a diferença entre referendo e plebiscito?

A principal distinção é que um plebiscito é convocado antes da elaboração de um ato legislativo ou administrativo que trate do assunto em questão.
Já um referendo é convocado posteriormente, para que a população aprove ou rejeite a proposta já elaborada.

De que maneira essas diferenças influenciariam na reforma política?

Pela proposta de Dilma, um plebiscito sobre a reforma política permitiria aos brasileiros posicionar-se sobre vários temas. Eles poderiam, por exemplo, decidir se o financiamento das campanhas deve ser público, privado ou misto; se o voto deve ser nos partidos, em listas fechadas, ou em candidatos; se deve ser criada uma cláusula de barreira para impedir que partidos pequenos assumem lugares na Câmara; e se a reeleição deve ser proibida.
Dilma disse ter se reunido com diversos movimentos sociais e quer uma consulta popular sobre a reforma
Caberia ao Congresso decidir quais perguntas serão feitas e elaborar uma proposta que respeitasse os resultados da consulta. Esse modelo daria aos eleitores maior poder na elaboração da proposta.
No caso de um referendo, o Congresso elaboraria uma proposta de reforma, e os eleitores teriam apenas o poder de chancelar ou vetar o projeto como um todo, sem poder modificá-lo. Esse modelo daria ao Congresso mais poder na elaboração da proposta.

Quais os argumentos favoráveis e contrários aos dois modelos?

Defensores do plebiscito dizem que, se a elaboração da reforma ficar a cargo do Congresso, dificilmente serão aprovadas medidas que descontentem deputados e senadores. A reforma, dizem eles, provavelmente seria tímida.
Eles afirmam que um plebiscito atenderia os anseios dos manifestantes que foram às ruas em junho de 2013 e pediram maior participação da sociedade nas decisões do Estado.
Já os defensores do referendo dizem que um plebiscito teria perguntas muito específicas e que dificilmente os eleitores estarão informados o suficiente para respondê-las. Afirmam, ainda, que as opções dos eleitores poderiam produzir uma proposta "frankenstein", difícil de pôr em prática.
Eles dizem que o Congresso é o órgão mais capacitado para a tarefa e detém a legitimidade para executá-la, por ser composto por deputados e senadores eleitos pelo povo. Afirmam, ainda, que a realização de um plebiscito reduziria a importância do Legislativo, afetando o equilíbrio entre os Três Poderes.
Leia mais: Dilma 'terá que acenar à classe média', dizem analistas

Quais foram os últimos plebiscitos no Brasil?

O último plebiscito estadual ocorreu em 2011, no Pará, quando os eleitores do Estado decidiram se as regiões de Carajás e Tapajós deveriam se tornar Estados autônomos. A maioria dos paraenses rejeitou a divisão.
O último plebiscito nacional ocorreu em 1993, quando os brasileiros puderam optar qual regime de governo vigoraria no país: se monarquia ou república e se parlamentarismo ou presidencialismo. Venceu a proposta por uma república presidencialista, regime que já vigorava.

Quais foram os últimos referendos?

No último referendo estadual, em 2010, os eleitores do Acre decidiram se o fuso horário no Estado deveria ser voltar a ser de duas horas a menos que Brasília, após ter sido alterado para uma hora a menos. A maioria aprovou a mudança para o horário antigo.
O último referendo nacional ocorreu em 2005, quando a população foi consultada sobre a proibição do comércio de armas de fogo no país.
A proibição estava prevista em artigo do Estatuto do Desarmamento, que havia sido aprovado em 2003. Os brasileiros, porém, rejeitaram a mudança.

Sudeste pode 'aprender com Nordeste a lidar com seca'


Governo paulista foi autorizado a usar 100 bilhões de litros extras do volume morto do Sistema Cantareira
O presidente do Conselho Mundial da Água, Benedito Braga, disse em entrevista à BBC Brasil que a atual crise hídrica em São Paulo e em outras cidades do Sudeste é uma "oportunidade" para esta região do país, que deveria se inspirar no exemplo do Nordeste para enfrentar o problema.
Segundo Braga, daqui em diante, o uso mais eficiente da água e o preparo para enfrentar períodos de estiagem se tornarão uma prioridade, assim como houve uma busca por eficiência energética e medidas capazes de evitar a falta de energia elétrica após os apagões do início da década passada.
"Em meio a essa crise no Sudeste, ninguém fala do Nordeste, que vive uma seca há três anos", destaca o hidrologista, que também é professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP).
"Esta região aprendeu com as crises do passado e criaram uma infraestrutura para conseguir sobreviver a este momento díficil. O Ceará é um bom exemplo disso."

Tarifa exponencial

Braga também defende que haja uma mudança no atual modelo de cobrança de tarifas de consumo de água.
Para o especialista, somente um aumento exponencial do preço seria capaz de fazer consumidores usarem este recurso de forma racional.
O hidrologista defende que seja imposto um limite "razoável" de consumo para cada residência e que, a cada metro cúbico utilizado além dele, o valor da tarifa seja em primeiro lugar triplicado.
Caso seja ultrapassado um segundo patamar de consumo, o preço seria elevado em seis vezes, e assim por diante.
"A única forma de fazer as pessoas reduzirem seu consumo é gerar um impacto no bolso."
A Sabesp já aplica um aumento progressivo do valor da tarifa de acordo com o consumo.
A empresa cobra em São Paulo um preço fixo de R$ 16,82 pelo uso de até 10m³.
Entre 11m³ e 20m³, a tarifa por metro cúbico sobe 56%. Se forem usados entre 21m³ e 50m³, o preço sobe mais 149%. Acima disso, há um acréscimo de 10% no valor do metro cúbico.
"Minha proposta é que o valor seja triplicado após um limite razoável para cada residência. Depois, sextuplicado", afirma Braga.
"Quando o consumidor receber a conta, vai perceber que não tem como pagá-la e ai vai entender que há uma crise e economizar."

Aumento do consumo

Benedito Braga (ao centro) diz que situação permanecerá grave mesmo após o verão
A proposta de Braga ganha relevância diante de números divulgados na última terça-feira a investidores pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp).
Esses números mostram que, mesmo em meio a pior crise de água já registrada na região atendida pela empresa, quase um quarto das residências paulistas teve um aumento no consumo de água.
A porcentagem das casas com esse aumento ficou em 24% em maio, baixou para 21% em junho, subiu para 26% em julho e está em cerca de 22% em agosto, segundo dados parciais contabilizados até o último dia 11.
Os dados da Sabesp ainda mostram que um bônus oferecido a paulistas que reduzirem seu consumo de água em 20% não foi capaz de gerar uma grande economia de água.
Desde fevereiro, as residências que cumprem com esta redução ganham um desconto de 30% na conta no fim do mês.
Mas o consumo nas 43 cidades da região metropolitana de São Paulo terminou o primeiro semestre com um aumento de 1,1%. Isso ocorreu por causa de um aumento de 4% entre janeiro e março.
Já entre abril e junho, houve uma redução de 2%, o equivalente a 6 bilhões de litros, algo que a Sabesp considerou "significativo" diante do aumento de 5% nas ligações de água neste período.

'Falta de consciência'

Para Braga, isso é um sinal de que a população não está consciente da crise hídrica, "caso contrário não haveria aumento do consumo".
"A mídia fala muito da crise, mas, se não impactar no bolso do cidadão, ele acha que é assim mesmo e que não é uma situação tão grave assim, porque tem água na torneira", diz o especialista.
O governo estadual paulista chegou a anunciar em abril que iria cobrar uma multa de 30% pelo aumento do consumo de água. A medida veio após quedas sucessivas do nível do Sistema Cantareira (que abastece a Grande São Paulo) por causa de uma escassez de chuvas.
A multa seria aplicada a partir de maio, foi adiada para junho e nunca chegou a sair do papel.
O governador paulista Geraldo Alckmin desistiu da medida em julho por considerá-la desnecessária diante do aumento do número de consumidores que aderiram ao programa de bônus da Sabesp.
Ele disse que "91% da população aderiu ao uso racional da água. Quase 40% ganhou o bônus", disse o governador na época.
Segundo dados de agosto da Sabesp, 78% dos consumidores reduziram seu consumo até agora.
"A multa gera muita confusão porque seu processo legal é complicado e ela pode ser questionada pelo Ministério Público", diz Braga.
"O aumento exponencial da tarifa é possível porque é uma decisão que cabe exclusivamente à agência reguladora."

Volume morto

Diante da perspectiva de falta de chuva até novembro, o governo do estado já obteve autorização para captar uma segunda parte do volume morto, estimada em 100 bilhões de litros.
Braga considera a medida "absolutamente necessária porque não há como fazer uma previsão climatológica de longo prazo".
"É uma forma de se precaver em relação a verão menos chuvoso, porque nenhuma obra de infraestrutura para levar mais água para o Sistema Cantareira será concluída no curto prazo", diz Braga.
"Obras já são por si só algo demorado e isso se agrava no nosso país, porque temos uma legislação ambiental e de licitações altamente complexa, o que faz com que obras levem dez vezes mais tempo aqui do que na China, por exemplo."
O especialista acredita que a escassez recorde de chuvas entre o final de 2013 e o início deste ano dificilmente se repetirá, mas esclarece que isso não significa que a crise estará resolvida.
"As previsões do CPTEC (Centro de Estudos do Tempo e Estudos Climáticos, órgão ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia) indicam que teremos um verão normal. Se isso se confirmar, chegaremos nesta mesma época do ano que vem com o nível dos reservatórios em 30%", diz Braga.
"Isso é preocupante, porque ai dependeremos de novo da chuva, e não podemos ficar à mercê da chuva."

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Quem escreveu a Bíblia?


dezembro
2008

Quem escreveu a Bíblia?

A história de Deus foi escrita pelos homens. Mas quem é o autor do livro mais influente de todos os tempos? As respostas são surpreendentes - e vão mudar sua maneira de ver as Escrituras

por Texto José Francisco Botelho

Em algum lugar do Oriente Médio, por volta do século 10 a.C., uma pessoa decidiu escrever um livro. Pegou uma pena, nanquim e folhas de papiro (uma planta importada do Egito) e começou a contar uma história mágica, diferente de tudo o que já havia sido escrito. Era tão forte, mas tão forte, que virou uma obsessão. Durante os 1 000 anos seguintes, outras pessoas continuariam reescrevendo, rasurando e compilando aquele texto, que viria a se tornar o maior best seller de todos os tempos: a Bíblia. Ela apresentou uma teoria para o surgimento do homem, trouxe os fundamentos do judaísmo e do cristianismo, influenciou o surgimento do islã, mudou a história da arte – sem a Bíblia, não existiriam os afrescos de Michelangelo nem os quadros de Leonardo da Vinci – e nos legou noções básicas da vida moderna, como os direitos humanos e o livre-arbítrio. Mas quem escreveu, afinal, o livro mais importante que a humanidade já viu? Quem eram e o que pensavam essas pessoas? Como criaram o enredo, e quem ditou a voz e o estilo de Deus? O que está na Bíblia deve ser levado ao pé da letra, o que até hoje provoca conflitos armados? A resposta tradicional você já conhece: segundo a tradição judaico-cristã, o autor da Bíblia é o próprio Todo-Poderoso. E ponto final. Mas a verdade é um pouco mais complexa que isso.
A própria Igreja admite que a revelação divina só veio até nós por meio de mãos humanas. A palavra do Senhor é sagrada, mas foi escrita por reles mortais. Como não sobraram vestígios nem evidências concretas da maioria deles, a chave para encontrá-los está na própria Bíblia. Mas ela não é um simples livro: imagine as Escrituras como uma biblioteca inteira, que guarda textos montados pelo tempo, pela história e pela fé. Aliás, o termo “Bíblia”, que usamos no singular, vem do plural grego ta biblia ta hagia – “os livros sagrados”. A tradição religiosa sempre sustentou que cada livro bíblico foi escrito por um autor claramente identificável. Os 5 primeiros livros do Antigo Testamento (que no judaísmo se chamam Torá e no catolicismo Pentateuco) teriam sido escritos pelo profeta Moisés por volta de 1200 a.C. Os Salmos seriam obra do rei Davi, o autor de Juízes seria o profeta Samuel, e assim por diante. Hoje, a maioria dos estudiosos acredita que os livros sagrados foram um trabalho coletivo. E há uma boa explicação para isso.
As histórias da Bíblia derivam de lendas surgidas na chamada Terra de Canaã, que hoje corresponde a Líbano, Palestina, Israel e pedaços da Jordânia, do Egito e da Síria. Durante séculos acreditou-se que Canaã fora dominada pelos hebreus. Mas descobertas recentes da arqueologia revelam que, na maior parte do tempo, Canaã não foi um Estado, mas uma terra sem fronteiras habitada por diversos povos – os hebreus eram apenas uma entre muitas tribos que andavam por ali. Por isso, sua cultura e seus escritos foram fortemente influenciadas por vizinhos como os cananeus, que viviam ali desde o ano 5000 a.C. E eles não foram os únicos a influenciar as histórias do livro sagrado.
As raízes da árvore bíblica também remontam aos sumérios, antigos habitantes do atual Iraque, que no 3o milênio a.C. escreveram a Epopéia de Gilgamesh. Essa história, protagonizada pelo semideus Gilgamesh, menciona uma enchente que devasta o mundo (e da qual algumas pessoas se salvam construindo um barco). Notou semelhanças com a Bíblia e seus textos sobre o dilúvio, a arca de Noé, o fato de Cristo ser humano e divino ao mesmo tempo? Não é mera coincidência. “A Bíblia era uma obra aberta, com influências de muitas culturas”, afirma o especialista em história antiga Anderson Zalewsky Vargas, da UFRGS.
Foi entre os séculos 10 e 9 a.C. que os escritores hebreus começaram a colocar essa sopa multicultural no papel. Isso aconteceu após o reinado de Davi, que teria unificado as tribos hebraicas num pequeno e frágil reino por volta do ano 1000 a.C. A primeira versão das Escrituras foi redigida nessa época e corresponde à maior parte do que hoje são o Gênesis e o Êxodo. Nesses livros, o tema principal é a relação passional (e às vezes conflituosa) entre Deus e os homens. Só que, logo no começo da Beeblia, já existiu uma divergência sobre o papel do homem e do Senhor na história toda. Isso porque o personagem principal, Deus, é tratado por dois nomes diferentes.
Em alguns trechos ele é chamado pelo nome próprio, Yahweh – traduzido em português como Javé ou Jeová. É um tratamento informal, como se o autor fosse íntimo de Deus. Em outros pontos, o Todo-Poderoso é chamado de Elohim, um título respeitoso e distante (que pode ser traduzido simplesmente como “Deus”). Como se explica isso? Para os fundamentalistas, não tem conversa: Moisés escreveu tudo sozinho e usou os dois nomes simplesmente porque quis. Só que um trecho desse texto narra a morte do próprio Moisés. Isso indica que ele não é o único autor. Os historiadores e a maioria dos religiosos aceitam outra teoria: esses textos tiveram pelo menos outros dois editores.
Acredita-se que os trechos que falam de Javé sejam os mais antigos, escritos numa época em que a religiosidade era menos formal. Eles contêm uma passagem reveladora: antes da criação do mundo, “Yahweh não derramara chuva sobre a terra, e nem havia homem para lavrar o solo”. Essa frase, “não havia homem para lavrar o solo”, indica que, na primeira versão da Bíblia, o homem não era apenas mais uma criação de Deus – ele desempenha um papel ativo e fundamental na história toda. “Nesse relato, o homem é co-criador do mundo”, diz o teólogo Humberto Gonçalves, do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos, no Rio Grande do Sul.
Pelo nome que usa para se referir a Deus (Javé), o autor desses trechos foi apelidado de Javista. Já o outro autor, que teria vivido por volta de 850 a.C., é apelidado de Eloísta. Mais sisudo e religioso, ele compôs uma narrativa bastante diferente. Ao contrário do Deus-Javé, que fez o mundo num único dia, o Deus-Elohim levou 6 (e descansou no 7o). Nessa história, a criação é um ato exclusivo de Deus, e o homem surge apenas no 6o dia, junto aos animais.
Tempos mais tarde, os dois relatos foram misturados por editores anônimos – e a narrativa do Eloísta, mais comportada, foi parar no início das Escrituras. Começando por aquela frase incrivelmente simples e poderosa, notória até entre quem nunca leu a Bíblia: “E, no início, Deus criou o céu e a terra...”
Em 589 a.C., Jerusalém foi arrasada pelos babilônios, e grande parte da população foi aprisionada e levada para o atual Iraque. Décadas depois, os hebreus foram libertados por Ciro, senhor do Império Persa – um conquistador “esclarecido”, que tinha tolerância religiosa. Aos poucos, os hebreus retornaram a Canaã – mas com sua fé transformada. Agora os sacerdotes judaicos rejeitavam o politeísmo e diziam que Javé era o único e absoluto deus do Universo. “O monoteísmo pode ter surgido pelo contato com os persas – a religião deles, o masdeísmo, pregava a existência de um deus bondoso, Ahura Mazda, em constante combate contra um deus maligno, Arimã. Essa noção se reflete até na idéia cristã de um combate entre Deus e o Diabo”, afirma Zalewsky, da UFRGS.
A versão final do Pentateuco surgiu por volta de 389 a.C. Nessa época, um religioso chamado Esdras liderou um grupo de sacerdotes que mudaram radicalmente o judaísmo – a começar por suas escrituras. Eles editaram os livros anteriores e escreveram a maior parte dos livros Deuteronômio, Números, Levítico e também um dos pontos altos da Bíblia: os 10 Mandamentos. Além de afirmar o monoteísmo sem sombra de dúvidas (“amarás a Deus acima de todas as coisas” é o primeiro mandamento), a reforma conduzida por Esdras impunha leis religiosas bem rígidas, como a proibição do casamento entre hebreus e não-hebreus. Algumas das leis encontradas no Levítico se assemelham à ética moderna dos direitos humanos: “Se um estrangeiro vier morar convosco, não o maltrates. Ama-o como se fosse um de vós”.
Outras passagens, no entanto, descrevem um Senhor belicoso, vingativo e sanguinário, que ordena o extermínio de cidades inteiras – mulheres e crianças incluídas. “Se a religião prega a compaixão, por que os textos sagrados têm tanto ódio?”, pergunta a historiadora americana Karen Armstrong, autora de um novo e provocativo estudo sobre a Bíblia. Para os especialistas, a violência do Antigo Testamento é fruto dos séculos de guerras com os assírios e os babilônios. Os autores do livro sagrado foram influenciados por essa atmosfera de ódio, e daí surgiram as histórias em que Deus se mostra bastante violento e até cruel. Os redatores da Bíblia estavam extravasando sua angústia.
Por volta do ano 200 a.C., o cânone (conjunto de livros sagrados) hebraico já estava finalizado e começou a se alastrar pelo Oriente Médio. A primeira tradução completa do Antigo Testamento é dessa época. Ela foi feita a mando do rei Ptolomeu 2o em Alexandria, no Egito, grande centro cultural da época. Segundo uma lenda, essa tradução (de hebraico para grego) foi realizada por 72 sábios judeus. Por isso, o texto é conhecido como Septuaginta. Além da tradução grega, também surgiram versões do Antigo Testamento no idioma aramaico – que era uma espécie de língua franca do Oriente Médio naquela época.
Dois séculos mais tarde, a Bíblia em aramaico estava bombando: ela era a mais lida na Judéia, na Samária e na Galiléia (províncias que formam os atuais territórios de Israel e da Palestina). Foi aí que um jovem judeu, grande personagem desta história, começou a se destacar. Como Sócrates, Buda e outros pensadores que mudaram o mundo, Jesus de Nazaré nada deixou por escrito – os primeiros textos sobre ele foram produzidos décadas após sua morte.
E o cristianismo já nasceu perseguido: por se recusarem a cultuar os deuses oficiais, os cristãos eram considerados subversivos pelo Império Romano, que dominava boa parte do Oriente Médio desde o século 1 a.C. Foi nesse clima de medo que os cristãos passaram a colocar no papel as histórias de Jesus, que circulavam em aramaico e também em coiné – um dialeto grego falado pelos mais pobres. “Os cristãos queriam compreender suas origens e debater seus problemas de identidade”, diz o teólogo Paulo Nogueira, da Universidade Metodista de São Paulo. Para fazer isso, criaram um novo gênero literário: o evangelho. Esse termo, que vem do grego evangélion (“boa-nova”), é um tipo de narrativa religiosa contando os milagres, os ensinamentos e a vida do Messias.
A maioria dos evangelhos escritos nos séculos 1 e 2 desapareceu. Naquela época, um “livro” era um amontoado de papiros avulsos, enrolados em forma de pergaminho, podendo ser facilmente extraviados e perdidos. Mas alguns evangelhos foram copiados e recopiados à mão, por membros da Igreja. Até que, por volta do século 4, tomaram o formato de códice – um conjunto de folhas de couro encadernadas, ancestral do livro moderno. O problema é que, a essa altura do campeonato, gerações e gerações de copiadores já haviam introduzido alterações nos textos originais – seja por descuido, seja de propósito. “Muitos erros foram feitos nas cópias, erros que às vezes mudaram o sentido dos textos. Em certos casos, tais erros foram também propositais, de acordo com a teologia do escrivão”, afirma o padre e teólogo Luigi Schiavo, da Universidade Católica de Goiás. Quer ver um exemplo?
Sabe aquela famosa cena em que Jesus salva uma adúltera prestes a ser apedrejada? De acordo com especialistas, esse trecho foi inserido no Evangelho de João por algum escriba, por volta do século 3. Isso porque, na época, o cristianismo estava cortando seu cordão umbilical com o judaísmo. E apedrejar adúlteras é uma das leis que os sacerdotes-escritores judeus haviam colocado no Pentateuco. A introdução da cena em que Jesus salva a adúltera passa a idéia de que os ensinamentos de Cristo haviam superado a Torá – e, portanto, os cristãos já não precisavam respeitar ao pé da letra todos os ensinamentos judeus.
A julgar pelo último livro da Bíblia cristã, o Apocalipse (que descreve o fim do mundo), o receio de ter suas narrativas “editadas” era comum entre os autores do Novo Testamento. No versículo 18, lê-se uma terrível ameaça: “Se alguém fizer acréscimos às páginas deste livro, Deus o castigará com as pragas descritas aqui”. Essa ameaça reflete bem o clima dos primeiros séculos do cristianismo: uma verdadeira baderna teológica, com montes de seitas defendendo idéias diferentes sobre Deus e o Messias. A seita dos docetas, por exemplo, acreditava que Jesus não teve um corpo físico. Ele seria um espírito, e sua crucificação e morte não passariam – literalmente – de ilusão de ótica. Já os ebionistas acreditavam que Jesus não nascera Filho de Deus, mas fora adotado, já adulto, pelo Senhor. A primeira tentativa de organizar esse caos das Escrituras ocorreu por volta de 142 – e o responsável não foi um clérigo, mas um rico comerciante de navios chamado Marcião.
A Bíblia segundo Marcião
Ele nasceu na atual Turquia, foi para Roma, converteu-se ao cristianismo, virou um teólogo influente e resolveu montar sua própria seleção de textos sagrados. A Bíblia de Marcião era bem diferente da que conhecemos hoje. Isso porque ele simpatizava com uma seita cristã hoje desaparecida, o gnosticismo. Para os gnósticos, o Deus do Velho Testamento não era o mesmo que enviara Jesus – na verdade, as duas divindades seriam inimigas mortais. O Deus hebraico era monstruoso e sanguinário, e controlava apenas o mundo material. Já o universo espiritual seria dominado por um Deus bondoso, o pai de Jesus. A Bíblia editada por Marcião continha apenas o Evangelho de João, 11 cartas de Paulo e nenhuma página do Velho Testamento. Se as idéias de Marcião tivessem triunfado, hoje as histórias de Adão e Eva no paraíso, a arca de Noé e a travessia do mar Vermelho não fariam parte da cultura ocidental. Mas, por volta de 170, o gnosticismo foi declarado proibido pelas autoridades eclesiásticas, e o primeiro editor da Bíblia cristã acabou excomungado.
Roma, até então pior inimiga dos cristãos, ia se rendendo à nova fé. Em 313, o imperador romano Constantino se aliou à Igreja. Ele pretendia usar a força crescente da nova religião para fortalecer seu império. Para isso, no entanto, precisava de uma fé una e sólida. A pressão de Constantino levou os mais influentes bispos cristãos a se reunirem no Concílio de Nicéia, em 325, para colocar ordem na casa de Deus. Ali, surgiu o cânone do cristianismo – a lista oficial de livros que, segundo a Igreja, realmente haviam sido inspirados por Deus.
“A escolha também era política. Um grupo afirmou seu poder e autoridade sobre os outros”, diz o padre Luigi. Esse grupo era o dos cristãos apostólicos, que ganharam poder ao se aliar com o Império Romano. Os apostólicos eram, por assim dizer, o “partido do governo”. E por isso definiram o que iria entrar, ou ser eliminado, das Escrituras.
Eles escolheram os evangelhos de Marcos, Mateus, Lucas e João para representar a biografia oficial de Cristo, enquanto as invenções dos docetas, dos ebionistas e de outras seitas foram excluídas, e seus autores declarados hereges. Os textos excluídos do cânone ganharam o nome de “apócrifos” – palavra que vem do grego apocrypha, “o que foi ocultado”. A maioria dos apócrifos se perdeu – afinal de contas, os escribas da Igreja não estavam interessados em recopiá-los para a posteridade. Mas, com o surgimento da arqueologia, no século 19, pedaços desses textos foram encontrados nas areias do Oriente Médio. É o caso de um polêmico texto encontrado em 1886 no Egito. Ele é assinado por uma certa “Maria” que muitos acreditam ser a Madalena, discípula de Jesus, presente em vários trechos do Novo Testamento. O evangelho atribuído a ela é bem feminista: Madalena é descrita como uma figura tão importante quanto Pedro e os outros apóstolos. Nos primórdios do cristianismo, as mulheres eram aceitas no clero – e eram, inclusive, consideradas capazes de fazer profecias. Foi só no século 3 que o sacerdócio virou monopólio masculino, o que explicaria a censura da apóstola e seu testemunho. Aliás, tudo indica que Madalena não foi prostituta – idéia que teria surgido por um erro na interpretação do livro sagrado. No ano 591, o papa Gregório fez um sermão dizendo que Madalena e outra mulher, também citada nas Escrituras e essa sim ex-pecadora, na verdade seriam a mesma pessoa (em 1967, o Vaticano desfez o equívoco, limpando a reputação de Maria).
Na evolução da Bíblia, foram aparecendo vários trechos machistas – e suspeitos. É o caso de uma passagem atribuída ao apóstolo Paulo: “A mulher aprenda (...) com toda a sujeição. Não permito à mulher que ensine, nem que tenha domínio sobre o homem (...) porque Adão foi formado primeiro, e depois Eva”. É provável que Paulo jamais tenha escrito essas palavras – porque, na época em que ele viveu, o cristianismo não pregava a submissão da mulher. Acredita-se que essa parte tenha sido adicionada por algum escriba por volta do século 2.
Após a conversão do imperador Constantino, o eixo do cristianismo se deslocou do Oriente Médio para Roma. Só que, para completar a romanização da fé, faltava um passo: traduzir a palavra de Deus para o latim. A missão coube ao teólogo Eusebius Hyeronimus, que mais tarde viria a ser canonizado com o nome de são Jerônimo. Sob ordens do papa Damaso, ele viajou a Jerusalém em 406 para aprender hebraico e traduzir o Antigo e o Novo Testamento. Não foi nada fácil: o trabalho durou 17 anos.
Daí saiu a Vulgata, a Bíblia latina, que até hoje é o texto oficial da Igreja Católica. Essa é a Bíblia que todo mundo conhece. “A Vulgata foi o alicerce da Igreja no Ocidente”, explica o padre Luigi. Ela é tão influente, mas tão influente, que até seus erros de tradução se tornaram clássicos. Ao traduzir uma passagem do Êxodo que descreve o semblante do profeta Moisés, são Jerônimo escreveu em latim: cornuta esse facies sua, ou seja, “sua face tinha chifres”. Esse detalhe esquisito foi levado a sério por artistas como Michelangelo – sua famosa escultura representando Moisés, hoje exposta no Vaticano, está ornada com dois belos corninhos. Tudo porque Jerônimo tropeçou na palavra hebraica karan, que pode significar tanto “chifre” quanto “raio de luz”. A tradução correta está na Septuaginta: o profeta tinha o rosto iluminado, e não chifrudo. Apesar de erros como esse, a Vulgata reinou absoluta ao longo da Idade Média – durante séculos, não houve outras traduções.
O único jeito de disseminar o livro sagrado era copiá-lo à mão, tarefa realizada pelos monges copistas. Eles raramente saíam dos mosteiros e passavam a vida copiando e catalogando manuscritos antigos. Só que, às vezes, também se metiam a fazer o papel de autores.
Após a queda do Império Romano, grande parte da literatura da Antiguidade grega e romana se perdeu – foi graças ao trabalho dos monges copistas que livros como a Ilíada e a Odisséia chegaram até nós. Mas alguns deles eram meio malandros: costumavam interpolar textos nas Escrituras Sagradas para agradar a reis e imperadores. No século 15, por exemplo, monges espanhóis trocaram o termo “babilônios” por “infiéis” no texto do Antigo Testamento – um truque para atacar os muçulmanos, que disputavam com os espanhóis a posse da península Ibérica.
Escrituras em série
Tudo isso mudou após a invenção da imprensa, em 1455. Agora ninguém mais dependia dos copistas para multiplicar os exemplares da Bíblia. Por isso, o grande foco de mudanças no texto sagrado passou a ser outro: as traduções.Em 1522, o pastor Martinho Lutero usou a imprensa para divulgar em massa sua tradução da Bíblia, que tinha feito direto do hebraico e do grego para o alemão. Era a primeira vez que o texto sagrado era vertido numa língua moderna – e a nova versão trouxe várias mudanças, que provocavam a Igreja (veja quadro na pág. 65). Logo depois um britânico, William Tyndale, ousou traduzir a Bíblia para o inglês. No Novo Testamento, ele traduziu a palavra ecclesia por “congregação”, em vez de “igreja”, o termo preferido pelas traduções católicas. A mudança nessa palavrinha era um desafio ao poder dos papas: como era protestante, Tyndale tinha suas diferenças com a Igreja. Resultado? Ele foi queimado como herege em 1536. Mas até hoje seu trabalho é referência para as versões inglesas do livro sagrado.
A Bíblia chegou ao nosso idioma em 1753 – quando foi publicada sua primeira tradução completa para o português, feita pelo protestante João Ferreira de Almeida. Hoje, a tradução considerada oficial é a feita pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e lançada em 2001. Ela é considerada mais simples e coloquial que as traduções anteriores. De lá para cá, a Bíblia ganhou o mundo e as línguas. Já foi vertida para mais de 300 idiomas e continua um dos livros mais influentes do mundo: todos os anos, são publicadas 11 milhões de cópias do texto integral, e 14 milhões só do Novo Testamento.
Depois de tantos séculos de versões e contra-versões, ainda não há consenso sobre a forma certa de traduzi-la. Alguns buscam traduções mais próximas do sentido e da época original – como as passagens traduzidas do hebraico pelo lingüista David Rosenberg na obra O Livro de J, de 1990. Outros acham que a Bíblia deve ser modernizada para atrair leitores. O lingüista Eugene Nida, que verteu a Bíblia na década de 1960, chegou ao extremo de traduzir a palavra “sestércios”, a antiga moeda romana, por “dólares”. Em 2008, duas versões igualmente ousadas estão agitando as Escrituras: a Green Bible (“Bíblia Verde”, ainda sem versão em português), que destaca 1 000 passagens relacionadas à ecologia – como o momento em que Jó fala sobre os animais –, e a Bible Illuminated (‘Bíblia Iluminada”, em inglês), com design ultramoderno e fotos de celebridades como Nelson Mandela e Angelina Jolie.
A Bíblia se transforma, mas uma coisa não muda: cada pessoa, ou grupo de pessoas, a interpreta de uma maneira diferente – às vezes, com propósitos equivocados. Em pleno século 21, pastores fundamentalistas tentam proibir o ensino da Teoria da Evolução nas escolas dos EUA, sendo que a própria Igreja aceita as teorias de Darwin desde a década de 1950. Líderes como o pastor Jerry Falwell defendem o retorno da escravidão e o apedrejamento de adúlteros, e no Oriente Médio rabinos extremistas usam trechos da Torá para justificar a ocupação de terras árabes. Por quê? Porque está na Bíblia, dizem os radicais. Não é nada disso. Hoje, os principais estudiosos afirmam que a Bíblia não deve ser lida como um manual de regras literais – e sim como o relato da jornada, tortuosa e cheia de percalços, do ser humano em busca de Deus. Porque esse é, afinal, o verdadeiro sentido dessa árvore de histórias regada há 3 mil anos por centenas de mãos, cabeças e corações humanos: a crença num sentido transcendente da existência.

Top 5 pragas

I. Quando os hebreus eram escravos no Egito, o Senhor enviou 10 pragas contra os opressores do povo escolhido. A primeira delas foi transformar toda a água do país em sangue (Êxodo 7:21).
II. Como o faraó não libertava os hebreus, o Senhor radicalizou: matou, numa só noite, todos os primogênitos do Egito. “E houve grande clamor no país, pois não havia casa onde não houvesse um morto” (Êxodo 12:30).
III. Desgostoso com os pecados de Sodoma e Gomorra, Deus destruiu as duas cidades com uma chuvarada de fogo e enxofre (Gênesis 19:24).
IV. Para punir as deso­bediências do rei Davi, o Senhor enviou uma doença não identificada, que matou 70 mil homens e 200 mil mulheres e crianças (2 Samuel, 24: 1-13).
V. Quando a nação dos filisteus roubou a arca da Aliança, onde estavam guardados os 10 Mandamentos, o Senhor os castigou com um surto de hemorróidas letais. “Os intestinos lhes saíam para fora e apodreciam” (1 Samuel 5:9) .

Os possíveis autores

1200 a.C. - Moisés
Segundo uma lenda judaica, a Torá (obra precursora da Bíblia) teria sido escrita por ele. Mas há controvérsias, pois existe um trecho da Torá que diz: “Moisés morreu e foi sepultado pelo Senhor próximo a Fegor”. Ora, se Moisés é o autor do texto, como ele poderia ter relatado a própria morte?
1000 a.C. - Javista
Viveu na corte do rei Davi, no antigo reino de Israel, e era um aristocrata. Ou, quem sabe, uma aristocrata: para o crítico Harold Bloom, Javista era mulher. Isso porque os personagens femininos da Bíblia (Eva e Sara, por exemplo) são muito mais elaborados que os masculinos.
Século 4 a.C. - Esdras
Líder religioso que reformou o judaísmo e possível editor do Pentateuco (5 primeiros livros da Bíblia). Vários trechos bíblicos editados por ele pregam a violência: “Derrubareis todos os altares dos povos que ides expropriar, queimareis as casas, e mudareis os nomes desses lugares”.
Século 1 - Paulo
Nunca viu Cristo pessoalmente, mas foi o primeiro a escrever sobre ele. Nascido na Turquia, Paulo viajou e fundou igrejas pelo Oriente Médio. Ele escrevia cartas para essas igrejas, contando a incrível aventura de um tal Jesus – que foi crucificado e ressuscitou.
Século 1 - Maria Madalena
Estava entre os discípulos favoritos de Jesus – e, diferentemente do que o Vaticano sustentou durante séculos, nunca foi prostituta. Pelo contrário: tinha influência no cristianismo e é a suposta autora do Apócrifo de Maria, um livro em que fala sobre sua relação pessoal com Jesus e divulga os ensinamentos dele.
Século 1 - João
Escreveu o 4o evangelho do Novo Testamento (João) e o Livro do Apocalipse, o último da Bíblia. Para ele, Jesus não é apenas um messias – é um ser sobrenatural, a própria encarnação de Deus. Essa interpretação mística marca a ruptura definitiva entre judaísmo e fé cristã.
Século 5 - Jerônimo
Nascido no território da atual Hungria, este padre foi enviado a Jerusalém com uma missão importantíssima: traduzir a Bíblia do grego para o latim. Cometeu alguns erros, como dizer que o profeta Moisés tinha chifres (uma confusão com a palavra hebraica karan, que na verdade significa “raio de luz”).
Século 16 - William Tyndale
Possuir trechos da Bíblia em qualquer idioma que não fosse o latim era crime. O professor Tyndale não quis nem saber, traduziu tudo para o inglês, e acabou na fogueira. Mas seu trabalho foi incrivelmente influente: é a base da chamada “Bíblia do Rei James”, até hoje a tradução mais lida nos países de língua inglesa.

Top 5 matanças

I. Um grupo de meninos malcriados zombou da calvície do profeta Eliseu. Pra quê! Na hora, dois ursos famintos saíram de um bosque e comeram as crianças (2 Reis 2:24).
II. Cercado por um exército de filisteus, o herói Sansão apanhou a mandíbula de um jumento morto. Usando o osso como arma, ele massacrou mil inimigos (Juízes, 15:16).
III. O profeta Elias convidou os sacerdotes do deus Baal para uma competição de orações. Era uma armadilha: Elias incitou o povo, que linchou os pagãos (1 Reis 18:40).
VI. Os judeus haviam perdido a fé e começaram a adorar um bezerro de ouro. Moisés ficou furioso e mandou sacerdotes levitas matar 3 mil infiéis (Êxodo 32:19).
V. A nação dos amalequitas disputava o território de Canaã com os judeus. O Senhor ordena que todos os amalequitas sejam chacinados (1 Samuel 15:18).

Top 5 satanagens

I. Após a destruição de Sodoma, os únicos sobreviventes eram Ló e suas duas filhas. As filhas de Lot embebedaram o pai e tiveram com ele a noite mais incestuosa da Bíblia (Gênesis 19:31).
II. O Cântico dos Cânticos, atribuído ao rei Salomão, é altamente erótico. Um dos trechos: “Teu corpo é como a palmeira, e teus seios, como cachos de uvas” (Cânticos 7:7).
III. Os anjos do Senhor tiveram chamegos ilícitos com mulheres mortais. “Vendo os Filhos de Deus que as filhas dos homens eram formosas, tomaram-nas como mulheres, tantas quanto desejaram” (Gênesis 6:2).
IV. A Bíblia diz que os antigos egípcios eram muito bem-dotados. Após a fuga para Canaã, a judia Ooliba tem saudades dos tempos em que se prostituía no Egito. Tudo porque “seus amantes (...) ejaculavam como cavalos” (Ezequiel 23:20).
V. O hebreu Onã casou com a viúva de seu irmão, mas não conseguia fazer sexo com ela – preferia o prazer solitário. Do nome dele vem o termo “onanismo”, que significa masturbação (Gênesis 38:9).

As história da história

Como o livro sagrado evoluiu ao longo dos tempos
Tanach - Século 5 a.C.
É a Bíblia judaica, e tem 3 livros: Torá (palavra hebraica que significa “lei”), Nebiim (“profetas”) e Ketuvim (“escritos”). É parecida com a Bíblia atual, pois os católicos copiaram seus escritos. Contém as sementes do monoteísmo e da ética religiosa, mas também pregações de violência. A primeira das bíblias tem trechos ambíguos e misteriosos – algumas passagens dão a entender que Javé não é o único deus do Universo.
Septuaginta - Século 3 a.C.
O Oriente Médio era dominado pelos gregos e pelos macedônios. Muitos judeus viviam em cidades de cultura grega, como Alexandria, e desejavam adaptar sua religião aos novos tempos. Diz a lenda que Ptolomeu, rei do Egito, reuniu um grupo de 72 sábios judeus para traduzir a Tanach – e fizeram tudo em 72 dias. Por isso, o resultado é conhecido como Septuaginta. Inclui textos que não constam da Tanach.
Novo Testamento - Século 1
A língua do Antigo Testamento é o hebraico, mas o Novo Testamento foi escrito num dialeto grego chamado coiné. Contém os relatos sobre vida, milagres, morte e ressurreição de Jesus – os evangelhos. Em alguns trechos, vai deixando evidente a divergência entre cristianismo e judaísmo. É o caso, por exemplo, do Evangelho de João, em que Jesus é descrito como uma encarnação de Deus (coisa na qual os judeus não acreditavam).
Católica - Século 4
Seus autores decidiram incluir 7 livros que os judeus não reconheciam. São os chamados Deuterocanônicos: Tobias, Judite, Sabedoria, Eclesiástico, Baruque, Macabeus 1 e 2 (mais trechos dos livros Daniel e Ester). A Bíblia católica bate na tecla do monoteísmo: a palavra hebraica Elohim, usada na Tanach para designar a divindade, é o plural de El, um deus cananeu. Mas foi traduzida no singular e virou “Senhor”.
Ortodoxa - Por volta do século 4
É baseada na Septuaginta, mas também inclui livros considerados apócrifos por católicos e protestantes: Esdras 1, Macabeus 3 e 4 e o Salmo 151. A tradução é mais exata (nesta Bíblia, Moisés nunca teve chifres, um erro de tradução introduzido pela Bíblia latina), e os escritos não são levados ao pé da letra: para os ortodoxos, o que conta são as interpretações do texto bíblico, feitas por teólogos ao longo dos séculos.
Protestante - Século 16
Ao traduzir a Bíblia para o alemão, Martinho Lutero excluiu os livros Deuterocanônicos e mudou algumas coisas. Um exemplo é a palavra grega metanoia, que na Bíblia católica significa “fazer penitência” – uma referência à confissão dos pecados, um dos sacramentos católicos. Já Lutero traduziu metanoia como “reviravolta”. Para ele, confessar os pecados era inútil. O importante era transformar a vida pela fé.

Top 5 milagres

I. O maior de todos os milagres divinos foi o primeiro: a Criação do mundo, pelo poder da palavra. “E Deus disse: que haja luz. E houve luz” (Gênesis 1:3).
II. Para dar-lhe uma amostra de seus poderes, o Senhor leva Ezequiel a um campo cheio de esqueletos – e os traz de volta à vida. “O vento do Senhor soprou neles, e viveram” (Ezequiel, 37; 1-28).
III. Graças à benção divina, o herói Sansão tinha a força de muitos homens. Certa vez, foi atacado por um leão. “O espírito do Senhor deu-lhe poder, e Sansão destroçou a fera com as próprias mãos, como se matasse um cabrito” (Juízes 14:6).
IV. Josué liderava uma batalha contra os amalequitas, mas o Sol estava se pondo. Como não queria lutar no escuro, o hebreu pediu ajuda divina – e o Sol ficou no céu (Josué 10:13).
V. Para fugir do Egito, os hebreus precisavam atravessar o mar Vermelho. E não tinham navios. Moisés ergueu seu bastão e as águas do mar se dividiram. Após a passagem dos hebreus, o profeta deixou que as ondas se fechassem sobre os exércitos do faraó (Êxodo 14; 21-30).

Para saber mais

A Bíblia: Uma Biografia
Karen Armstrong, Jorge Zahar Editora, 2007.
Who Wrote the Bible?
Richard Elliott Friedman, HarperOne, 1997.